sexta-feira, 13 de junho de 2014

Nunca busquei a felicidade

Carroça de Feno - John Constable


Nunca busquei a felicidade...
Sei lá que coisa é essa,
Que de tão abstrata, valerá o esforço?
Procurei viver cada momento,
Não como se fosse o último,
Mas como a possibilidade
De muitos outros, um eterno renascer.
Procurei ser reto,
Quase nunca o pude.
Até os rios fazem suas curvas
Por entre os morros,
Em direção ao mar.
Só não fui avaro no amor que dediquei,
Nisso abundei até a exaustão.
E se me dei tão por completo,
Mais do que me dei, a tudo a que me entreguei,
Pois amar é mais do que se dar,
É se diluir completamente em algo.
Por não buscar a felicidade,
Acho que sou mais feliz que muitos outros,
Porque acabo sendo feliz por nada.
Minha alegria vem das coisas mais banais,
Até mesmo das pequenas tristezas
Que transformo em versos.
Vem da janela quando olho o mar, ou as montanhas,
Ou os campos que se perdem nos horizontes.
Vem do cachorro do vizinho
E do seu olhar alegre ao me ver passar.
Vem daquele dente faltoso no sorriso
Da criança com quem cruzo ao ir buscar o pão.
Eu dou também valor às coisas grandiosas,
Com as quais a minha alma se embevece:
O Universo à minha volta é uma delas.
Mas, grande valor àquilo, que por nada, me faz curvar.
Como aquela florzinha perdida no caminho,
Me provocando por entre as pedras do pavimento
E gritando aos meus olhos: sou também beleza e vida!
Há algo de metafórico na minha visão do mundo,
Que não encontra a mínima justeza
Na vida que as pessoas normais levam.
Talvez a minha loucura o impeça,
Não há como eu me compatibilizar
Com a insensibilidade de quem não se curva
A nenhuma flor perdida no caminho.
Tenho sido um proscrito por causa disso,
Mas vou reter o impulso de me lamentar,
Pelo menos aqui, pelo menos por hora.
Uma vez ouvi um ditado,
Mas cujas palavras já não me lembro,
E, por quase sempre não me lembrar de qualquer um,
Resolvi eu mesmo penetrar só nos mistérios do mundo.
E, assim, me descobri tão perdido,
Que me achei em poesia.

S. Quimas

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