sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Vivo tão somente de incertezas

Laurent Marqueste - Perseus Slaying Medusa


Vivo tão somente de incertezas
E cada minuto para mim,
Não é senão um todo imponderável.
Mistério tão imenso
Que nem à adivinhação eu me atrevo.
E, assim, sigo feito cego
Que anda sem qualquer orientação,
Pois que desconhece seus caminhos
Por nunca ter por eles caminhado.
A única coisa precisa em minha vida
É que quanto mais vivo,
Mais me aproximo da morte.
Não que a morte me assuste,
Ou por ela tenha qualquer tristeza,
É tão certa e natural
Quanto comer e excretar.
A vida, essa sim, tem me colhido
Frutos nem sempre tão doces,
Tem me fustigado o que pode,
Tem me dobrado e me tornado
Servo de minhas muitas limitações.
Mas, não lamento ter existido.
Se faço lamúria é pela dor
E ainda assim, dela faço versos.
Ao menos em alguma coisa
O mau fado me traz proveito,
Traz-me inspiração.
Há flores em minha vida,
Ainda que nasçam em túmulos.
Mas também as tumbas e mausoléus
Tem lá sua graça.
E muitos carregam anjos de pedra,
Airosos, mas presos à rigidez do mármore,
Que lhes dá corpo e forma.
Eu não retrato a realidade em minha poesia,
Descrevo o sentimento que ela provoca.
Uso as palavras, pois me encanta usá-las,
Poderia usar silêncios ou somente pensamentos,
Porém tenho ganas de aprisionar
A sensibilidade na superfície do papel.
Em alguns momentos faço-o com rara beleza,
Em outros parece que algo foge
E torna branca a tinta preta sobre a pauta,
Deixando escapar o espírito
Que lhes deveria animar.
Mas é também assim com a própria Natureza,
Nem toda a semente se torna novos frutos.
Tem horas que me embriago tanto de poesia,
Que até deliro e já não pertenço mais a mim,
Ou a este mundo,
Minha alma se faz poema
Tinto de muitos infinitos.
E vou assim seguindo,
Sem muito pensar onde a estrada me leva,
Pois o que importa são os passos dados
E as flores colhidas no caminho,
Importa o céu e a miríade de estrelas,
Ainda que tenha que advinha-las
Quando o manto negro se veste de nuvens.
O que verdadeiramente importa,
Não é tanto vê-las,
Mas ter a certeza que estão lá.

S. Quimas

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