quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Tempos Modernos

Maserati Birdcage 75th Concept


Era um desses automóveis de última geração. Havia custado uma fábula, mas valia cada centavo pago. Todo eletrônico: computador de bordo, GPS, DVD player com USB para pendrive, estacionava sozinho, radar para evitar choques, e por aí vai. O suprassumo da indústria automobilística carregado de parafernálias computadorizadas.
Contudo, o mais fantástico naquela máquina, que fazia de zero a cem quilômetros em segundos, era o sistema inteligente, espécie de autômato que cuidava de todo o funcionamento do carro, avisando de possíveis problemas, de que o combustível estava acabando, enfim, controlando, todos os detalhes de navegação. Bastava ao motorista entrar, plugar a chave eletrônica, pedir ao sistema que programasse o trajeto, pedir que desse a partida, e... voilá! O carro ia embora pelo caminho, sem sequer haver a necessidade de ser dirigido pelo condutor. O próprio carro se encarregava de chegar ao local determinado de modo totalmente autônomo. Esse sim, um AUTOmóvel de verdade. Um luxo!
Nesse dia, o biliardário, dono do veículo foi até a garagem e resolveu dispensar o motorista.
— Hoje você pode folgar, Antônio. Vou dirigindo o meu automóvel novo.
Antônio, o motorista, pensou lá com seus botões: “Dirigindo? Hum! Essa máquina faz tudo sozinha! Só falta servir cafezinho. Estou vendo que meu emprego vai durar pouco. Melhor aproveitar a folga e já vendo se acho outro...”.
— Pois não, Senhor Roberto. Qualquer coisa, estarei com o meu celular. — Disse o motorista ao patrão, retirando-se para sua casa em seguida.
Roberto parou por alguns instantes diante da máquina, que mais parecia uma nave espacial com rodas, e disse embevecido:
— Vamos lá, meu disco voador, me leve para o trabalho. Vamos matar de inveja essa gente toda!
Deu dois tapinhas no capô e se dirigiu à porta do lado do motorista.
— Carro, abra a porta! — Disse Roberto para o automóvel, que imediatamente cumpriu suas ordens.
Sentou-se no banco, pôs o cinto de segurança, introduziu a chave no painel e novamente ordenou para o carro:
— Carro, feche a porta! — A porta se fechou.
— Carro, dê partida! — Nada.
— Carro, dê partida! — Nada novamente.
Embatucado com a atitude do automóvel, Roberto esbravejou:
— Mas que diabos está acontecendo com esse carro maluco?
De repente, para a surpresa do dono, o automóvel lhe responde:
— A partida só pode ser dada pelo comando do proprietário.
— Ora, diabo de carro maluco, eu sou o proprietário. Dê a partida agora!
— A voz de comando não pode ser identificada pelo sistema de bordo. Por favor, identifique-se.
Já impaciente, com o rosto avermelhado pela raiva que estava sentindo, Roberto cedeu ao pedido:
— Roberto Santa Rosa.
— Repita o código alfanumérico cadastrado no sistema.
— L23... A12... G19... O67.
— O código confere.
“Ufa!” Pensou Roberto, dando um suspiro de alívio.
— Então vamos lá! Carro, dê a partida.
— A partida não pode ser dada. — Disse o carro mais uma vez para desespero de Roberto.
— Mas que diabo! O código não confere? Por que não pode dar a partida agora? — Gritou Roberto, já com vontade de esmurrar o painel de tão irado estava.
— O sistema detecta que o tanque está sem combustível. Encha o tanque para dar a partida. — Pediu o carro para Roberto.
— Droga! Só faltava essa! Sem combustível. Vou matar o Antônio... — Exclamou o enraivecido proprietário. — Carro, abra a porta.
Roberto retirou o cinto de segurança e foi a um canto da garagem, onde havia um reservatório de combustível. Pegou a mangueira, encheu um galão e voltou para o carro, carregando o tanque com combustível suficiente para dar a partida e poder estacionar mais próximo ao reservatório e completá-lo.
— Pronto, agora temos combustível. — Falou Roberto, entrando novamente no automóvel e seguindo o ritual de antes.
— Carro, dê a partida!  — Esperou alguns segundos. Nada. O carro não dava a partida.
— A partida não pode ser dada. Pneus necessitam ser calibrados.
Roberto já estava atrasado pelo menos uns vinte minutos e ainda teria que encher o tanque antes de sair. Estressado ao extremo com a situação, não pode evitar esmurrar o painel do automóvel. Machucou a mão com a atitude, o que o deixou ainda mais irado.
— Merda de lata-velha irritante! — Esbravejou enfurecido.
Segundos depois, começou a sair um fio de fumaça de uma das áreas do painel.
— Droga, agora essa porcaria está pegando fogo. Carro, abre a porta!
Silêncio. Nenhuma resposta.
— Mas que é que está havendo? Droga, droga, droga! Queimou o computador. Agora eu estou perdido! Droga!
Roberto, aflito, pegou o celular do bolso do paletó e tentou ligar para casa para que alguém viesse ajudá-lo. Sinal de ocupado. Tentou outra vez. Ainda ocupado. Tentou buzinar. O sistema elétrico do carro havia sido cortado.
— Alô, Senhor Roberto! Algum problema? — Era Antônio atendendo uma chamada do patrão em desespero.


Luz e paz.

S. Quimas

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